Fogo que arde, se vê: amor e cinema, a partir de O Fogo Interior
- André Quevedo Pacheco
- 16 de fev.
- 2 min de leitura

Imagens em erupção. O que elas dizem do amor que conhecemos, e do amor que elas inventam
Não se faz necessário citar Camões. Talvez lembrar, mas muito brevemente, de Vinicius de Moraes, que também comparou fogo e amor, mas na forma da chama que não é imortal, mas eterna enquanto dura. Pré-românticos, românticos, e pós-românticos já consumiram o combustível dessa analogia. A história real do casal Katia e Maurice Krafft – vulcanólogos que passaram a vida estudando e filmando vulcões até serem mortos por um – poderia ser gasta nessa seara metafórica.
O filme de Werner Herzog, O Fogo Interior: Réquiem para Katia e Maurice Krafft (2022), está consciente dessa possibilidade. No início do filme, na sua apresentação da biografia de Katia e Maurice, Herzog descreve o encontro do casal em 1966. Se conheceram quando estavam na casa dos vinte anos, ambos vindos de aldeias no leste da França e aficionados por vulcões, e ficaram juntos desde então. Aqui seria possível traçar as bases de um filme romântico: o encontro das almas de dois jovens, feitos um para o outro, e que levam a razão de seu amor até o limite de uma morte conjunta com ares suicidas. Essa linha se esboça pelas imagens idílicas dos campos verdes do interior francês, que ilustram o breve relato sobre a juventude do casal. No entanto, o filme a interrompe. Volta logo em seguida aos momentos anteriores à morte dos Krafft. Imagens acinzentadas, vagarosas e cruas de uma banalidade desconcertante. Tédio, preparações, a bateria do zoom da câmera com problema, discussões do casal. O romantismo óbvio, que dá ao encontro amoroso magnético e à paixão incontrolada a sua transcendência, teria pouco a dizer sobre a verdade dessa história.
Basta reparar no olhar dos Krafft nas fotografias usadas no filme. Não vemos a busca encantada por aquele outro, sem o qual não se pode viver. Vemos a contaminação de um olhar no outro, certa semelhança de expressão. Como se compartilhassem não o segredo íntimo da conexão de seus espíritos, mas uma relação com o mundo...
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